Primeiro de Maio é dia do TRABALHADOR

O Primeiro de Maio é uma data de grande significado na história das lutas sociais em todo o mundo. A data foi escolhida por um congresso internacional de trabalhadores, realizado em Paris em 1889, para homenagear cinco operários que participaram de uma greve, em Chicago, nos EUA, em 1886.

Desenvolvimento industrial e a resistência operária

No final do século passado, abriam-se as portas das senzalas e os trabalhadores negros conheciam outra faceta do capitalismo, o sub-emprego e a miséria. Espertamente, os capitalistas e a aristocracia do país “importavam” mão de obra européia desde o final da monarquia. A motivação era antes de mais nada racista: - “Construir uma potência  branca na América do Sul” diziam eles, e depois econômica. Vieram os operários e camponeses imigrantes e outra vez mais os trabalhadores recebem a acolhida típica do país tropical: exploração a níveis desumanos.

 

Com estes operários imigrantes veio também a primeira carga de ideologia revolucionária das classes oprimidas. Os poderosos do Brasil, que tanto queriam mão de obra assalariada branca, não gostaram nenhum pouco do que o proletariado trazia consigo nas malas, corações e mentes. Então, apelidaram de “flor exótica” a ideologia de libertação da classe trabalhadora. A acusavam de ser uma idéia sem raízes no povo gentil, pacífico e ordeiro destas terras. “Idéias de estrangeiros que não querem saber de trabalhar!” gritavam os parasitas dominantes.

 

Nestes tempos, o anarco-sindicalismo e o sindicalismo revolucionário impulsionava a auto-organização da classe em luta, então essencialmente de origem imigrante - daí ser chamada de classe operária imigrante. Nunca nenhum movimento de massas urbano foi tão forte! Nunca os trabalhadores brasileiros avançaram tanto em suas lutas! Nunca a classe dominante tremeu tanto de pavor!

 

Organizando, impulsionando e avançando a classe e o povo em luta, o movimento operário criou meios para gerar valores diferentes daqueles vividos pelos dominantes. Como movimento de massas, tínhamos um projeto popular completo para a “Emancipação dos trabalhadores que é obra dos próprios trabalhadores!”. Assim, os trabalhadores tinham seu instrumento de luta e conquista econômica (os sindicatos livres ou sindicalistas-revolucionários), de educação libertária e popular (as escolas racionalistas e as universidades do povo), de cultura de classe (os ateneus operários, bibliotecas sindicais, grupos de teatro social, bandas e liras operárias, atividades de lazer e recreação para toda a família trabalhadora), de literatura operária (com a edição e distribuição em massa de livros como A Conquista do Pão, O Salário, No Café, Germinal; e um estilo de romances e contos do proletariado ), de informação (os jornais operários) e de defesa (os grupos de auto-defesa e sabotagem).

 

Um belo exemplo de como a companheirada brigava como povo, “porque a agressão feita a um é uma agressão feita a todos”, é o caso das operárias tecelãs. Em sua maioria mulheres jovens (a média de idade era de 14 anos), trabalhando de 12 a 16 horas por dia, um salário de miséria e em péssimas instalações industriais, cedo estas operárias perdiam qualquer esperança com a vida. Era infelizmente comum que patrões ou gerentes as enganassem com falsas promessas, arrasando ainda mais sua dignidade e auto-estima. Nesses tempos, nos meios operários, nenhum homem ou mulher, mesmo que seduzido, nem se relacionava com o inimigo de classe. A concepção era que “um patrão que seduz ou engana uma operária violenta a classe inteira!” A atitude a ser tomada era sempre de solidariedade (com a tecelã) e luta (contra a patronal). A resposta vinha de dia com piquetes, manifestações, greves e boicotes. E por vezes à noite, quando companheiros de ação sabotavam a fábrica ou levavam a justiça dos oprimidos às últimas conseqüências.

 

A estratégia então utilizada era a da “ginástica revolucionária” (estica e puxa até que um dia arrebenta). Consistia em impulsionar a luta de classes num sentido profundamente anti-capitalista, dando ênfase de que em cada tarefa, por mais simples que for, se ajuda a construir um caminho da libertação proletária e popular. Os militantes funcionavam como impulsionadores da classe, sempre fomentando um estado de mobilização por reivindicações concretas. A briga era para conquistar avanços e necessidades, tanto nas qüestões classistas (como a jornada de 8 horas, piso salarial, melhores condições de trabalho, pelo fim das perseguições sindicais, etc.) como nas qüestões gerais (contra a guerra e o serviço militar, contra o alcoolismo, contra a exploração comercial da fé, contra a fome e a carestia, pela libertação da mulher). Nas lutas concretas de participação massissa os militantes forjaram, na idéia e na ação, o combate social ao sistema opressor.

 

Mas nada disso foi fácil ou veio de graça. A burguesia considerava  que: “a qüestão social é um caso de polícia!” e jogava a repressão - particular e estatal - sobre nós. Eram constantes as batidas de casa em casa, perseguições aos militantes operários mais conhecidos, listas negras nas fábricas para os militantes sindicais, prisões, torturas, assassinatos e deportações. Em Roraima, fronteira com as Güianas, fizeram um campo de concentração para os anarquistas durante o governo de Bernardes, a famigerada Clevelândia. Mas, com a dignidade habitual, sapateiros, padeiros, gráficos, metalúrgicos, ferreiros, carpinteiros, pedreiros, operários têxteis, professores, comerciários, garçons, portuários, condutores e outras categorias do proletariado libertário sempre davam a resposta do povo contra a repressão da burguesia e seus lacaios: fugas da Clevelândia e de outras prisões, diversas vezes derrotamos a repressão em enfrentamentos e a patronal na luta de classes, também várias delegacias e quartéis voaram pelos ares nesses tempos.

 

Nas primeiras décadas do século XX, em especial nos tempos  da Confederação Operária Brasileira (COB, teve seus congressos nos anos de 1906, 1913 e 1920) e das Federações Operárias estaduais - estas resistiram até o golpe do Estado Novo em 1937-, as cidades brasileiras mais importantes estiveram em momentos de ruptura revolucionária. Por mais de uma vez cidades do porte de São Paulo, Rio de Janeiro, Porto Alegre, Santos e outras mais caíram nas mãos do operariado. Houve também uma tentativa de insurreição, no Rio, e participamos de todos os episódios históricos até o final dos anos 30. Isto porque a função libertária era - e é - a de estarmos na primeira linha de combate popular, nunca como uma vanguarda mas sim como militantes dedicados à emancipação de nossa classe e povo.  

 

O momento auge era quando se davam as condições para uma greve mais radicalizada. Esta greve puxava outra e mais outra até que toda a classe parava em solidariedade. Os trabalhadores tomavam e geriam os meios de produção, expulsávamos a repressão (muitas vezes a base de dinamite), os sindicatos organizavam expropiações nos grandes comércios e cuidavam da distribuição de alimentos, os jornais burgueses eram empastelados ou sabotados e nossa imprensa circulava absoluta. Era a chamada ?cidade proletária?, ensaio insurrecional e de poder popular  muitas vezes repetido. Para garantir as conquistas e negociar com a patronal e o estado, era indicado um organismo político, composto por militantes  de consenso. Este organismo era denominado Comitê Operário, Conselho de Greve ou Liga de Defesa do Povo. Assim vieram as maiores conquistas da classe e do povo em luta. Com a dedicação integral e abnegada de milhares de lutadores. Companheiras e companheiros que generosamente davam o melhor de si para a mais justa das causas - o socialismo e a liberdade -, muitas das vezes entregando suas vidas para o avanço e a emancipação popular.  

 

Óbvio que tamanha capacidade de luta não ficaria sem resposta da burguesia e de seus aliados. No final dos anos 20, começa a ascenção da classe média no cenário político nacional, cujo melhor exemplo é o tenentismo. Na virada da década, estas camadas médias (militares, profissionais liberais, funcionários públicos de médio e alto escalão, intelectuais, pequenos e médios comerciantes, etc.) foram capitalizadas pelos marxistas e seu partido e pelos ?liberais?. Para o meio operário, importaram da Itália fascista a ?Carta del Lavoro? de Mussolini, e com o apoio de pelegos  esta foi implementada como Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), surgindo junto com o Ministério do Trabalho. Até as vésperas do Estado Novo, lutavam construindo palmo a palmo o terreno sindical e popular das grandes cidades. Uma passagem marcante deste período foi quando colocaram os galinhas verdes (integralistas) para correr, debaixo de bala, da Praça da Sé em São Paulo - em 1934 e 1935. Com o golpe de 1937, foram fechados os sindicatos livres e  Em 1945, quando caiu a ditadura Vargas, o pior já estava feito: a classe trabalhadora quebrada em sua ideologia, em seus organismos de luta de massas e na sua identidade e valores classistas.

  

História: Movimento operário na República Velha

O Primeiro de Maio é uma data de grande significado na história das lutas sociais em todo o mundo. A data foi escolhida por um congresso internacional de trabalhadores, realizado em Paris em 1889, para homenagear cinco operários que participaram de uma greve, em Chicago, nos EUA, em 1886. Reivindicavam a redução da jornada de trabalho para oito horas. Provas forjadas envolveram os operários num atentado, e eles foram julgados e condenados ao enforcamento.

 

No Brasil, as primeiras notícias das lutas operárias remontam a 1858, quando tipógrafos do Rio de Janeiro entraram em greve reivindicando aumento de salário. Nesses momentos iniciais da organização do movimento operário, destacou-se a influência da ideologia anarquista, trazida ao Brasil pelos trabalhadores imigrantes, sobretudo italianos e espanhóis.

 

O anarquismo era um movimento revolucionário que propunha a extinção do Estado, a democracia direta, o fim da propriedade privada dos meios de produção e a igualdade social. Era contrário aos organismos de representação (Parlamento, partido) e defendia a organização autônoma dos trabalhadores em seus locais de trabalho.

 

Sob a liderança dos anarquistas, ocorreu a maior greve de que se tem notícia na primeira metade do século 20 no Brasil. A paralisação, iniciada em junho de 1917, começou no setor têxtil, propagou-se rapidamente e atingiu a área portuária e o interior, envolvendo cerca de 50 mil trabalhadores. As principais reivindicações eram aumento de salários, proibição do trabalho infantil, jornada de oito horas, garantia de emprego e direito de associação.

 

O governo reprimiu o movimento com todos os recursos de que dispunha, mobilizando a polícia, tropas militares e até a Marinha de guerra, mas não foi bem-sucedido. Teve de negociar, e algumas das principais reivindicações foram atendidas.

 

A Revolução Russa, também em 1917, aumentou o prestígio do comunismo entre as classes trabalhadoras e, a partir de 1922, com a fundação do Partido Comunista Brasileiro, os comunistas passaram a disputar com os anarquistas a hegemonia sobre o movimento operário.

 

Foi para combater a influência dessas ideologias de esquerda que Vargas traçou uma estratégia de cooptação do movimento operário a partir de 1930, com o trabalhismo. Mas isso é assunto para um outro dia...

 

Roberson de Oliveira

é autor de "História do Brasil: Análise e Reflexão" e "As Rebeliões Regenciais" (Editora FTD) e professor no Colégio Rio Branco e na Universidade Grande ABC