O legado da EXPOCATADORES 2013

De 18 a 20 de dezembro, São Paulo (Parque de Exposições do Anhembi) sediou Expo Catadores 2013 – um dos maiores encontros focado no desenvolvimento sustentável inclusivo. Reunindo cerca de 8.000 (oito mil) pessoas – catadores brasileiros, latino-americanos, caribenhos asiáticos, africanos e europeus; especialistas e pesquisadores em gestão de resíduos sólidos, representantes do poder público, empresas e acadêmicos – o evento consagra-se como uma atividade aglutinadora dos debates do reconhecimento e valorização do trabalho do catador na gestão de resíduos.

A Expo pautou debates temáticos em conferências, painéis, oficinas e mesas redondas. Análises de cenários como os paradigmas da política nacional de gestão de resíduos (PNRS), a logística reversa e os acordos intersertoriais, a prestação de serviços da coleta seletiva, os negócios sustentáveis na gestão de resíduos, o panorama do mercado da reciclagem no Brasil, o papel das redes de comercialização no mercado da indústria da reciclagem,  gênero e diversidade sexual no universo da catação, a promoção  da inclusão de catadores de rua e lixões nas organizações de catadores, dentre outras, tomaram conta das discussões. Além dos debates, ponto marcante do evento foi a Celebração de Natal dos Catadores e a População de Rua com a presidenta Dilma Rousseff.

A comunicação Insea fez um balanço, conversando com as lideranças de catadores do Movimento Nacional  dos Catadores de Materiais Recicláveis (MNCR) Alex Cardoso, Irineide Lima e Roberto Rocha.

GANHO DA EXPO 2013

Para Alex Cardoso, catador e membro da coordenação do MNCR no Rio Grande do Sul (RS), um importante marco da Expo 2013 foi o debate em torno da popularização da reciclagem. “Conseguirmos emplacar as discussões políticas da reciclagem popular na Expo Catadores”, enfatiza.  No evento, o tema ganhou força e adesão, no discurso da presidenta Dilma durante o encontro com os catadores e a população de rua. A Expo traz maior visibilidade do conceito da reciclagem popular. Alex afirma que há muito anos, os catadores vêm trabalhando nesta discussão. “Aqui, conseguimos trabalhar nas oficinas, nos trabalhos e nos vários momentos para que catadores com catadores, catadores com governos e todos os atores que articulam a gestão dos resíduos assumam este compromisso”, argumenta. O coordenador do MNCR no Rio Grande do Sul pontua que “é hora do mercado da reciclagem compreender e assumir o conceito na prática”. Para ele, “cada um dos setores da sociedade têm os fragmentos da reciclagem popular. O que precisamos é integrar e criar o modelo”.

A catadora Irineide Lima, que integra a coordenação do MNCR  na Amazônia Legal , analisa que um grande significado do evento é a consolidação política da coleta seletiva e da valorização dos catadores.  A possibilidade de encontro com  lideranças de catadores de diversas regiões e países é traduzida por Irineide, consolidando o reconhecimento do trabalho, no ganho político proporcionado pela Expo. “Saímos daqui com a certeza de que a Expo vem para fortalecer a integração e a nossa força. Fazemos as coisas com a cara e coragem no norte (Amazônia Legal) do Brasil. Falta apoio e não temos a tem a valorização necessária”, comenta.

“É possível fazer coleta seletiva com eficiência e com o catador” admite Roberto Rocha, da coordenação do MNCR em São Paulo (SP), como a questão central dos debates da Expo.  Os gestores das políticas de resíduos precisam assumir a coleta com a contratação das associações e cooperativas em todo o Brasil. Roberto considera que este ganho será resultado da “força articuladora dos catadores, junto aos parceiros, apreendendo todas as ferramentas tecnológicas e educacionais de gestão de resíduos que precisam ser absorvidas”.

 

NOVAS BANDEIRAS

Analisando a caminhada do MNCR na causa dos catadores, Alex considera ser necessário assumir novas bandeiras. “Até hoje, o Movimento correu atrás de reafirmação, reconhecimento e bases legais. Estamos passando este ciclo, que se fechou na PNRS”, explica.

O catador do Rio Grande do Sul Alex sugere “nós, catadores, temos que acordar

e levantarmos a bandeira no campo econômico, na gestão de negócios e na prestação de serviços

”. E classifica “temos que sair da condição de associação que necessita de assistencialismo, para uma condição de gestores e prestadores de serviços à sociedade”. Alex é efusivo “é hora de sairmos do campo do marco legal para o campo do marco econômico”.

Embasando na economia solidária, e na defesa da vida, Irineide defende ser necessário que o MNCR e todos os catadores e parceiros reafirmem as bandeiras do companheirismo e da cooperação. “A

solidariedade é um grande marco da Expo, que une e deve mover o Movimento e cada um de nós

. Ela é o sentido de existir das associações e cooperativas”, afirma a catadora manauara.  Com os desafios colocados, a catadora esclarece que, em termos práticos, “os associados e cooperados devem se ajudar mutuamente para os desafios que estão colocados.”

Na avaliação de Roberto,

o pagamento pelo serviço prestado aos catadores é a grande bandeira a ser defendida pelo MNCR

. “As tecnologias geram custo e só coletar material e vender, não  garante nossa  sobrevivência,” exorta o catador de São Paulo.

BRASIL E ARTICULAÇÃO LATINO-AMERICANA

A Expo deixou claro o papel do Brasil, através do MNCR, como importante fomentador da integração latino-americana. Irineide analisa “a nossa articulação e diálogo com outros países é um elemento positivo para os ganhos políticos e nas trocas de experiências”.

Alex relembra que “o avanço na política continental é resultado de uma articulação que acontece já há 10 anos, quando do Congresso Latino-Americano (2003)”. O catador acrescenta “lá discutíamos que deveríamos romper as fronteiras da solidariedade, as fronteiras da exploração – não só na luta dos catadores, mas de todas as pessoas em situação de vulnerabilidade”.

Falando do Brasil como um modelo, Roberto afirma que “a América Latina e o mundo têm nos catadores brasileiros a referência de organização  e trabalho”.  Neste sentido, afirma o catador “saímos da Expo com bastante engajamento dos companheiros latino-americanos”.  A experiência do MNCR é vista com importante para os catadores de outros países. Roberto sintetiza “eles assimilam cada vez mais a experiência brasileira de tecnologia social  da coleta seletiva, levam-na para os seus países e colocam-nas em prática”. O catador paulista se enche de otimismo ao sinalizar os compromissos continentais para 2014. “Temos uma agenda positiva e profunda, construída com secretarias assumidas pelos países”, informa.

O percurso futuro é de fortalecimento da Rede Latino-Americana de Catadores. Alex encara que este é uma estratégia que o Movimento deve priorizar.  “Com a força política do MNCR, precisamos abrir horizontes e perspectivas para a América Latina, esclarece. Concretamente, o catador gaúcho sinaliza, “precisamos definir agendas maiores e integradas, construirmos mecanismos de erradicação da pobreza e da exclusão social e trabalharmos em função do meio ambiente e não o contrário, ou seja, o meio ambiente trabalhar para nós”.