Prefeitura de Santa Cruz do Sul pretende retirar conquistas históricas dos catadores/as

Proposta prevê a entrega da Usina Municipal de Triagem e parte da Coleta seletiva a inciativa privada

Na tarde de quarta-feira (02/03), uma comissão de catadoras e catadores da Cooperativa Coomcat realizou reunião com a Prefeita Municipal Helena Hermany para tratar de temas relacionados a gestão dos resíduos sólidos no município gaúcho, que pelo reconhecimento e valorização do trabalho realizado pela cooperativa se tornou uma das referências nacionais de inclusão sócio produtiva da categoria e de um serviço de qualidade com participação da comunidade.

Porém os rumos tomados pela atual administração estão indo contrários a estas importantes conquistas das catadoras e catadores organizados, que prestam o serviço de gestão da Usina Municipal de Triagem desde 2010 e o serviço de Coleta seletiva Solidária em 15 bairros desde o ano de 2012.

A reunião foi motivada pela falta de diálogo com a categoria e construção de alternativas para avançar o serviço de coleta e resolver os problemas na usina municipal. “O atual secretário do meio ambiente, Jaques Eisenberger, que tem se mostrado uma pessoa autoritária e incompetente, quer entregar tudo o que conquistamos a duras penas para as grandes empresas, não vamos aceitar.” comenta a catadora Angela Nunes, se referindo aos projetos que ainda não estão bem explicados a população santacruzense de privatização da usina de triagem e parte da coleta seletiva.

Entenda as propostas da Prefeitura

Segundo a Prefeita Helena Hermany, sem dar maiores detalhes, disse que “não aguenta ver as pessoas trabalhando naquelas condições na usina, não fui eleita pra isso, vou fechar aquele lixão”. Depois de muito questionada, disse que irá licitar a construção de uma nova usina e repassar a uma empresa privada. Existem rumores, e também consta em seu plano de governo de que os custos desse novo empreendimento gire em torno de 20 milhões de reais, e que faria parte de uma concessão por mais de 20 anos a uma empresa.

Em relação ao avanço da coleta seletiva a Prefeita disse que irá licitar o restante dos bairros que a cooperativa não atende(20) e irá destinar os materiais a cooperativa. “Vocês podem participar da licitação” disse a Prefeita.

Além disso a Prefeitura recentemente, instalou conteineres “laranjas” para os recicláveis, tecnologia comprovadamente ineficaz. E também regularizou a coleta de resíduos por empreendimentos que não possuem esta finalidade através da lei de transportadores de resíduos( 8.659/2021);

Um conjunto de ações que vem inviabilizando o aumento da reciclagem no município. Sem falar na falta de transparência na construção de alternativas para enfrentar estes desafios.

Entenda as propostas da cooperativa

Há mais de uma década as catadoras e catadores aguardam investimentos na atual usina municipal de resíduos sólidos, que está em péssimas condições e apresenta riscos aos trabalhadores; e apesar destas condições insalubres, a Coomcat (recebeu o título de utilidade pública da Câmara de Vereadores de Santa Cruz do Sul) resiste neste local executando a triagem e transbordo de 91 toneladas/dia de resíduos sólidos.

A cooperativa já investiu mais de 280 mil reais na infraestrutura do local, e tem muitos equipamentos e veículos disponibilizados a municipalidade, cuja depreciação sempre foi custeado pelos próprios catadores.

As catadoras e catadores apresentaram um projeto de sistema de triagem, com capacidade de triar 100% dos resíduos sólidos que hoje chegam até a usina (91 toneladas/dia) ao custo aproximado de 1,5 milhões, permitindo inclusive o trabalho com resíduos orgânicos (43,54% do total de resíduos, conforme Plano Municipal de Gestão Resíduos Sólidos, revisão 2018) e seria implantado num pavilhão adequado a atividade e que existe dentro da usina (isto permite a inclusão de mais 20 catadoras e catadores), na qual a Coomcat pagou mais de 60 mil reais para regularizar de acordo com as exigências legais para tal atividade.

A cooperativa apresentou este projeto em setembro de 2021, e não obteve resposta da prefeitura

Em relação ao avanço da Coleta Seletiva Solidária, que é o modelo de coleta, que tornou Santa Cruz do Sul reconhecida nacionalmente, a Coomcat entregou uma proposta a prefeitura que atende mais nove bairros e atinge 75% da população do município, com a implementação de mais uma unidade de trabalho, gerando a inclusão de mais 20 catadoras e catadores, e que progressivamente, alcançaria 100% dos bairros/população.


“Esperamos que a Prefeitura retroceda nos seus planos, e construa propostas com participação da sociedade civil, que leve em considerações os fatores ambientais, econômicos e sociais, e não só baseie suas decisões em discursos assistencialistas e sem embasamento técnico”, comenta o catador Uilian Mendes, membro da Coomcat e assessor técnico da Associação Nacional dos Catadores e Catadoras-ANCAT.

Também participaram da reunião Douglas Filgueiras pela Associação pelo Voluntariado e Solidariedade-Avesol e Fagner Jandrey pela Secretaria Estadual do Movimento Nacional dos Catadores e Catadoras de Materiais Recicláveis-MNCR.

“Estamos muito surpresos com estas propostas da prefeitura, porque quer fazer os catadores/as voltarem no tempo em que só se vivia de doações de materiais.Imagina seja qual for a profissão, se tu consegue sobreviver só com a doação da matéria-prima do seu trabalho e não pelo pagamento pelo seu serviço? e é isso que a prefeitura quer fazer com essas propostas.” Comenta Fagner Jandrey.

Durante a reunião foi entregue uma pauta de reivindicações a Prefeita, a qual a cooperativa aguarda a resposta em nova reunião. Após a reunião foi lançado também um manifesto a população para explicação da situação e pedido de apoio e solidariedade a causa, e principalmente pela continuidade e avanço da parceria com as catadoras e catadores.

Para Douglas Filgueiras, da Avesol,“a solução está no diálogo, nos propomos a fazer parte de um grupo de trabalho para pensar uma alternativa que não exclua os catadores/as como protagonistas do serviço”.

Atualmente a cooperativa gera 54 postos de trabalho em suas duas unidades de trabalho.