Carta do MNCR para a Presidênta Dilma Rousseff
São Paulo, 15 de Dezembro de 2013
Carta à presidente Dilma
Passados 13 anos de luta e organização da categoria é preciso registrar as conquistas alcançadas. Secolocarmos todos os recursos investidos pelo governo federal através de seus diversos órgãos (MDS, MCidades, SENAES/MTE, FUNASA/MS, BNDES, MCT, CEF, BB, FBB, Petrobras) obteríamos a soma de mais de 590 milhões já investidos nos processos de estruturação, organização e formação de catadores. Valor investido que ajudou, de forma decisiva, consolidar os mais de 30 mil postos de trabalho de catadores organizados em associações e cooperativas.
Os diversos programas contribuíram o reconhecimento do catador de material reciclável como profissional. Nessa nova condição, gostaríamos de avançar no diálogo com o governo federal.
Desde a carta de Brasília reivindicamos “Garantir nas políticas de financiamentos e subsídios, que os recursos públicos sejam aplicados, prioritariamente, na implantação de uma política de industrialização dos materiais recicláveis que priorizem os projetos apresentados por empresas sociais de Catadores de Materiais Recicláveis, garantindo-lhes acesso e domínio sobre a cadeia da reciclagem, como estratégia de inclusão social e geração de trabalho e renda.”.
Esse objetivo está sendo lentamente atingido por meio dos diversos programas de estruturação das cooperativas. O cenário atual, com a implementação da Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), exige que avancemos dos programas pontuais para uma política pública estruturante da cadeia produtiva da reciclagem popular.
A PNRS reconhece o resíduo sólido como um bem econômico e de valor social, gerador de trabalho e renda e promotor de cidadania. Duas diretrizes fundamentais da PNRS reforçam a priorização da reciclagem: a hierarquização na gestão e tratamento dos resíduos sólidos e a logística reversa sob responsabilidade do setor empresarial produtor de parte destes resíduos. Além disso, a lei determina que as cooperativas e associações de catadores têm prioridade na contratação para prestação de serviços relativos à Gestão Integrada dos Resíduos Sólidos.
Diversos estudos mostram que a ação dos catadores é responsável pelos altos índices de reciclagem de alguns materiais, principalmente alumínio, papel e alguns tipos de plásticos. A coleta seletiva solidária, realizada por cooperativas de catadores enquanto serviço público, já é realidade em 22 municípios brasileiros. A sua expansão, conforme determina a PNRS, potencializará a retirada de maior quantidade e diversidade de materiais recicláveis do meio ambiente. À medida que o índice brasileiro de coleta seletiva aumentar, será preciso desenvolver, expandir e implementar a indústria da reciclagem.
Atualmente as indústrias recicladoras encontram-se concentradas em algumas regiões do país. As distâncias muitas vezes tornam inviável a separação de determinados tipos de materiais. Na Amazônia, por exemplo, papelão é lixo, pois o atual desenho da cadeia produtiva da reciclagem torna sua destinação adequada impossível. Em vez de ser reciclado, ele polui os rios. Dessa forma, a organização do setor, segundo interesses exclusivamente mercantis não está contribuindo para a efetivação das determinações da PNRS.
Diante dessa realidade, defendemos que a expansão da indústria da reciclagem popular seja planejada de acordo com o interesse público, que concilie proteção ambiental, geração de trabalho e distribuição da riqueza. Diversas cooperativas e redes estão expandindo suas atividades produtivas para o pré-beneficiamento dos materiais recicláveis. Temos, portanto, como perspectiva, o avanço dos catadores na cadeia de valor da reciclagem, com ele incluindo paulatinamente ao conjunto das atividades de coleta e triagem que realizam, atividades de beneficiamento industrial dos recicláveis, constituindo uma cadeia produtiva de outro tipo, à qual damos o nome de Reciclagem Popular. Ela consiste, nesse sentido, em um objetivo de médio prazo no qual a cadeia produtiva da reciclagem estaria organizada segundo a autogestão e sob controle dos catadores e da população em geral.
Essa proposta está sendo debatida e qualificada em diversos espaços, entre eles destacam-se:
- IV Conferência Nacional do Meio Ambiente
- 1º Seminário Nacional Rotas Tecnológicas para a Gestão e Tratamento de Resíduos Sólidos e a Reciclagem diante da Política Nacional de Resíduos Sólidos(PNRS), ocorrido nos dias 25 e 26 de Setembro de 2013, na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG)
- V Simpósio Nacional de Tecnologia e Sociedade, ocorrido de 16 a 18 de Outubro em Curitiba.
- 12º Festival Lixo & Cidadania
- Coalizão Nacional contra a Incineração
- Fóruns de Apoio à Coleta Seletiva Solidária
- Fórum Lixo e Cidadania
- Fóruns de Economia Solidária
- Grupos de pesquisa de diversas Universidades
- Organizações Não Governamentais
Essa reivindicação já conta, portanto, com uma ampla rede de apoiadores oriundos da academia, de entidades de apoio e de espaços de participação da sociedade civil. Um dos frutos desse processo é o documento “Por uma Rota Tecnológica de Gestão e Tratamento de Resíduos favorável à Reciclagem”, que apresenta uma agenda de pesquisa condizente com a proposta apresentada pelo MNCR.
Para a consecução desse objetivo, que atende os princípios da justiça social, preservação ambiental e é condizente com a PNRS, reivindicamos a elaboração de um Programa Nacional de Investimento na Reciclagem Popular (PRONAREP)
Esse programa deverá
- Introduzir uma política de financiamento estruturante às organizações de catadores, superando a lógica concorrencial instaurada pelo financiamento via editais;
- Considerar as especificidades regionais para a instalação dos pólos industriais;
- Prever o investimento em Pesquisa e Desenvolvimento para soluções adequadas à Rota Tecnológica da Reciclagem Popular;
- Articular as diferentes políticas de educação, saúde, habitação, erradicação do trabalho infantil, assistência social para a população catadora.
Movimento Nacional dos Catadores e Catadoras de Materiais Recicláveis-MNCR